"O rádio faz história." Rádio MEC AM.
Rose Esquenazi
A mais importante novela do rádio |
O brasileiro adora as
novelas e esse gosto vem de longe. Em 12 de junho de 1941, às 10h30, a novela Em busca da felicidade entrou no ar com
uma grande promoção. A Rádio Nacional tinha feito um acordo com o americano
Richard Penn, do departamento de marketing da Colgate, que ofereceu a emissora
o folhetim que iria ao ar três vezes por semana. O formato já estava sendo
testado nos Estados Unidos e em vários países da América Latina e faria sucesso
também no Brasil. O que havia aqui, antes dos anos 40, era o radioteatro em que
as histórias começavam e terminavam no mesmo dia.
(A Segunda Guerra já
tinha começado na Europa em 1939. Em 1941, os Estados Unidos começaram a desenvolver a Política da Boa
Vizinhança. Eles precisavam construir o
aeroporto em Natal, para chegar à África rapidamente, e, em troca, eles
emprestariam o dinheiro para a construção da Siderúrgica de Volta Redonda e
trariam bens de consumo para o país: como a Coca-Cola, a Kibon, produtos de
beleza e novelas!)
A novela começava assim:
“Senhoras e senhoritas, o famoso creme dental Colgate tem o prazer de
apresentar o primeiro capítulo da empolgante novela de Leandro Blanco, em
adaptação de Gilberto Martins “Em busca
da felicidade””. A imprensa registrou o grande frisson que o público sentiu
através das ondas sonoras na estreia do novo formato. O livrinho com a sinopse
da novela, que seria distribuído entre os ouvintes, se esgotou rapidamente.
Foram 48 mil cartas escritas por donas de casa. Que incluíam uma embalagem do
creme dental, pedindo uma cópia gratuita! Nunca havia acontecido isso.
Na novela, as histórias
podiam se esticadas em vários meses. Costumavam ser melodramáticas e sempre ao
vivo, o que aumentava a tensão, o sofrimento e também as doses de ternura, amor
e paixão. As mulheres que não trabalhavam fora de casa naquela época, ficavam
cuidando dos filhos e preparando a comida, com o rádio ligado. Elas se emocionavam
profundamente com o que ouviam porque os temas faziam parte da vida delas: o homem
que traía a mulher, o irmão que era alcoólatra, o filho bastardo.
A novela ficou três anos no ar. A Nacional percebeu que tinha
espaço para lançar outros horários de ficção. Assim, ocupou mais um andar do
prédio A Noite, e convocou mais radioatores, adaptadores, orquestras, diretores,
contrarregras e produtores. Montou uma casa de sonoplastia para que fossem criados
ao vivo efeitos sonoros: barulho de chuva, soldados marchando, tiros, telefone
tocando etc. O
papel do narrador vai ser muito importante para as novelas porque cria a
ambiência da história, apresenta as características dos personagens e das
tramas.
Os horários de folhetim
se multiplicaram na Rádio Nacional, havia cinco, seis novelas ao longo de todo
o dia, tornando-se referência novela em todo o país. A mais famosa de todas as
novelas foi O Direito de nascer.
Também foi escrita em Cuba, que era o grande celeiro de melodramas
rocambolescos. De autoria de Félix Caignet e tradução de Eurico Silva, chegou a
ter 73 pontos de audiência. Estreou no ar no dia 8 de janeiro de 1951 e durou um
ano e oito meses,com 260 capítulos. Demorou
tanto para acabar que ganhou o apelido de “O direito de encher”, o saco, naturalmente.
A novela ainda não era
diária e era transmitida às
segundas, quartas e sextas, às 20h, parando o país. Maria Helena, a mocinha
rica que engravida de um homem casado iria sofrer um grande drama. Quando disse
a frase: “Doutor, não posso ter esse filho que vai nascer”, provocou uma
enxurrada de lágrimas. Escondida do pai dela, que não queria a criança, ela decide
se tornar freira. Mas, antes de ir para o convento, dá para a antiga empregada
da casa – a boa Mamãe Dolores – o seu bebê, que ganhará o nome de Albertinho
Limonta, que nem enxoval tinha.
Tristes com a história de
Albertinho, várias ouvintes preparam enxovais
para o bebê e mandavam para o prédio da Nacional, como se o personagem fosse um
bebê de verdade. A Rádio Nacional registrou esses presentes em seu livro
comemorativo de 20 anos, em 1956.
É bom lembrar essa
ingenuidade estava muito presente na época. Os atores que interpretavam
personagens bons e sofredores ganhavam presentes das fãs e eram glorificados. Por
exemplo, Albertinho, interpretado pelo ator Paulo Gracindo, tinha hordas de
adoradoras. Já os vilões das histórias apanhavam na porta da Rádio Nacional,
eram xingados na rua. A emissora foi obrigada a abrir uma porta lateral para
que esses artistas tão odiados saíssem sem que ninguém visse.
A partir dos anos 60, a
novela foi montada três vezes na TV. A primeira versão fez tanto que o consumo
de água no Rio de Janeiro caía a nível zero durante a transmissão. Em 1964, ninguém cozinhava, tomava banho ou
lavava as mãos no horário da novela “O Direito de nascer”. O país parava de
funcionar.
http://radios.ebc.com.br/ todas-vozes/edicao/2014-07/o- rio-de-janeiro-parava-e-o- consumo-de-agua-diminuia-pelo- direito-de
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