Rose Esquenazi
Fascinação, de 1957
No quadro O Rádio Faz História, do seu programa Todas as Vozes, já apresentamos grandes cantores que fizeram parte
da Época de Ouro da Música Brasileira: Francisco Alves, “O Rei da Voz”; Orlando
Silva, “O Cantor das Multidões”; Sílvio Caldas, “O Caboclinho Querido”. Ficou
faltando um: Carlos Galhardo, “O cantor que dispensa adjetivos”.
Vamos tentar lembrar a obra que ele nos deixou, que costuma ser tão esquecida.
Chega a ser uma injustiça.
Como os outros cantores de grandes
vozes, Galhardo frequentou a Rádio Nacional e conquistou milhares de fãs. Foi
um importante intérprete de valsas, mas também cantou boleros e sambas.
Ouvimos, na abertura do quadro, uma das mais lindas canções gravadas até hoje, Fascinação. Na voz de Carlos Galhardo, a
música arrancava suspiros, principalmente das mulheres apaixonadas e
românticas, loucas para se casar.
Vamos contar a história do começo. O
nome verdadeiro de Carlos Galhardo era Catello Carlos Guagliardi. Ele nasceu em
26 de abril de 1913, em Buenos Aires. Os pais italianos emigraram para a
capital argentina depois de uma rápida
passagem pelo Brasil. Mas a família voltou e, aos quatro meses, Catello passou
a viver no Rio de Janeiro.
Para sobreviver, ele trabalhou em
algumas alfaiatarias. Em uma delas, conheceu o barítono Salvador Grimaldi. Os
dois faziam duetos de ópera já que os eram apaixonados pela música italiana.
Depois, trabalhou em uma tabacaria.
Informalmente, a carreira começou durante uma festa na casa de um irmão
de Carlos Galhardo, onde estavam Mário Reis e Lamartine Babo. Cantou Deusa, de Freire Junior, do repertório
do Rei da Voz, e agradou bastante os convidados. Foi aconselhado a fazer um
teste no rádio. E foi o que ele fez.
O sonho de todos os jovens, na época,
é claro, era cantar no rádio. Assim fez o primeiro teste na Rádio Educadora do
Brasil, com o compositor e violonista Bororó. Adivinhe onde foi que isso
aconteceu? No banheiro da estação! Devia ter uma boa acústica, acredito. A
música que abriu as portas para a carreira de Carlos Galhardo no rádio foi Destino, de Nonô e Luís Iglesias. E não
é que parece que foi o destino que ajudou muito na carreira? No dia seguinte,
Galhardo foi convidado para fazer o primeiro teste para o diretor da gravadora
RCA Victor, Mr. Evans. Ele cantou a música de Noel Rosa: Até amanhã. Mas foi com uma canção dos Irmãos Valença, Você não gosta de mim, que ele gravou o
primeiro disco. A carreira na indústria fonográfica foi longa e rica. Depois de
Francisco Alves, não houve quem gravasse tanto.
Ganhou também o apelido de O Rei do Disco.
Baseada nas informações do programa Musicograma, da Rádio Nacional, que fez
um especial com Carlos Galhardo, descobri que o cantor fazia de tudo nos coros
das gravadoras. Assim conseguiu aprender
todos os ritmos: fox, valsa, bolero, marcha e samba. Em tudo que cantava, ele
imprimia a sua linda voz e personalidade. Soube também que ele gostava muito da
música, ainda sem letra, que abria o programa Cidade Maravilhosa, de César Ladeira. Era Fascinação, de Fermo Dante Marchetti. Por isso, pediu a Armando Louzada que
compusesse a letra dessa música que iria se tornar um clássico da MPB e um dos
carros-chefes de sua carreira.
Carlos Galhardo gravou um dos grandes
sucessos criados por Nássara: Allah-lá-ó. Até hoje, ela é cantada nos bailes de Carnaval. Segundo o próprio
compositor, o sucesso da música se deve a 78% à interpretação de Galhardo. Vamos ouvir Allah-lá-ó:
https://www.youtube.com/watch?v=6rXzTxcIpOo
O compositor
Custódio Mesquita fez uma aposta com Galhardo. Entre as duas novas músicas que
ele compôs, Mesquita disse que Rosa de
Maio faria mais sucesso na voz de Galhardo. O cantor achou que seria Gira Gira, com a co-autoria de Evaldo
Ruy. Quem ganhou a gravata da aposta?
Custódio Mesquita. Vamos ouvir Rosa
de Maio?
https://www.youtube.com/watch?v=rUHnbJjAH9E
Tal
como Orlando Silva, Carlos Galhardo apareceu em filmes. Ele participou do
elenco dos filmes Banana da
terra, dirigido por J. Ruy (1938), Vamos cantar, de Leo Martins (1940), Entra na farra, de Luís de Barros (1941), Carnaval
em lá maior, de Ademar Gonzaga (1955) e Metido
a bacana, de J. B. Tanko (1957). Com seu bigodinho e belo porte, era seguido pelas
fãs do cinema também.
Ganhou muito
espaço nos cassinos e nos shows pelo país.
Depois, com o fim dos cassinos, passou incólume pelos movimentos que
modernizaram a música brasileira, tais como Bossa Nova, Jovem Guarda e
Tropicalismo. Não se interessou por nenhum deles e nem mesmo pela TV, que
começou no Brasil em 1950. Mas, com o
tempo, as coisas foram mudando. Assisti pelo You Tube a uns trechos de alguns
programas musicais dos quais o cantor, bem mais velho, se apresentou contando a
sua história. Ele apareceu na Cidade de Conservatória, distrito de Valença, que
cultiva a seresta até hoje. O ambiente musical combinava com o cantor. Por
isso, ele compôs Conservatória, Apoteose
da Felicidade.
Em 1941, gravou Boas Festas de Assis Valente. Mais um
grande sucesso de Carlos Galhardo. Vamos ouvir a marcha natalina.
Como outros
grandes cantores da música brasileira, Galhardo gravou, em 1945, um disco infantil. Ao lado de Dalva de Oliveira, gravou a música Os Trovadores, uma adaptação
de João de Barro para a história
infantil Branca de Neve e os sete anões, com canções de
Radamés Gnattali.
Eu disse que ele
mudou com o tempo e, em 1970, Galhardo gravou um disco no estilo Bossa Nova. O
último álbum foi feito em 1979, em que misturou Ary Barroso e Chico Buarque.
Diferentemente de outros artistas que morreram muito cedo, tiveram vários
problemas com a bebida e outras drogas, Carlos Galhardo se manteve saudável e
morreu aos 72 anos, em julho de 1985. Sempre foi casado com a mesma mulher. Até
o final da vida, manteve a agenda cheia de compromissos.
Vamos ouvir,
para terminar, Eu sonhei que estavas tão linda, de Lamartine Babo e Francisco
Matoso. Emocionante até hoje, grande interpretação de Carlos Galhardo.
Eu sonhei que estavas tão linda https://www.youtube.com/watch?v=5hHoRXzd8PI
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