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Blog – O Rádio Faz História
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Oswaldo Diniz Magalhães dando aula no programa "Hora da Ginástica" |
Atualmente,
os alunos de Comunicação sorriem quando a gente fala que existiu durante 50
anos um programa de educação física pelo rádio. A ideia da “Hora da Ginástica” pode
parecer ridícula hoje, quando existem academias em cada esquina da cidade. Mas
imaginem nos anos 30 e 40, quando os homens não sabiam direito como os
exercícios físicos eram benéficos para a saúde. Quando muito, alguns remavam,
lutavam boxe, jogavam futebol ou se
exercitavam no clube do bairro ou no exército, pensando em participar de uma
possível guerra. As mulheres só raramente faziam balé e preferiam, de longe,
exercitar os dedos para tocar bem o piano para conquistar a família do futuro
noivo!
Pois
bem, o carioca Oswaldo Diniz
Magalhães (1904-1998) teve uma grande ideia quando começou a se exercitar
andando de bicicleta no começo do século passado e depois ao decidir fazer um
curso para se formar em professor de educação física. Ele foi obrigado a ir
para o Uruguai porque ainda não existia curso no Brasil. No país vizinho, ele leu
uma estatística que o deixou amargurado: os brasileiros quase não se
exercitavam e morriam cedo, vitimados por doenças facilmente tratáveis.
Oswaldo pensou então em propagar as maravilhas
dos exercícios quando voltasse ao Brasil. Poderia usar o rádio, que começava a
se popularizar nos anos 30, para a divulgação de suas aulas. Ele estava cheio de ideais cívicos quando teve
essa ideia. Em seu depoimento, Oswaldo
contou que penou muito para convencer os donos de estação de rádio dizendo que
seria uma boa iniciativa oferecer aulas gratuitas todas as manhãs. Quanta
decepção, ele escreveu. Mas eis que o proprietário da Rádio Educadora Paulista,
que era médico e que também acreditava nos benefícios da ginástica, decidiu
pedir uma aula-demonstração. Adorou o que viu e, em 1932, tinha início a “Hora
da Ginástica”. O sucesso foi muito grande.
O subtítulo do programa explicava que era uma
Escola de Saúde, Moral e Civismo. É interessante a gente notar que “a
preocupação com a educação física e a associação entre esporte e civismo”,
começou nos anos 30 com o Estado Novo, segundo nos ensina o historiador
Maurício Parada no livro “Educando corpos e criando a nação” (Editora PUC Rio e
Apicuri). Antes de 1930, havia clubes e
associações atléticas nos bairros, entre grupos de imigrantes. Aos poucos, os
amadores ganhavam mais profissionalismo nas competições, ganhando algum
dinheiro para se dedicar ao esporte predileto. Todos os jornais passaram a ter uma
seção esportiva, o que mostrava que havia um mercado. Mas para os militares, médicos higienistas e
pedagogos, a ideia era “melhorar o tipo racial”. O conceito era bastante
preconceituoso e elitista. Escolhiam um tipo humano, branco e atlético. Os
outros eram considerados inferiores.
Na frente do microfone, com a ajuda de um
pianista no estúdio, o professor convocava toda a família para acompanhar cada
um dos exercícios usando ou não um simples bastão. As aulas começavam às 6h da
manhã e, geralmente, era feita na sala da casa ou no quintal do ouvinte. Nas
bancas, todos podiam comprar os mapas dos exercícios que iam se revezando
conforme as ordens do professor.
Oswaldo dizia qual era o número do exercício
que o ouvinte iria começar a fazer. Bastava que se colocasse como a figura e,
depois, acompanhar os movimentos. O último exercício era uma corrida para o
chuveiro. A imprensa questionou a validade das aulas já que não havia ninguém
para corrigir os alunos, caso não estivessem realizando os exercícios de
maneira adequada. Havia charges ridicularizando as pessoas tortas que não
tinham entendido as ordens de Oswaldo. Nos anos 50, a dupla de humor do PRK-30
também ironizou as aulas do professor. Mas a caricatura era muito divertida.
Vamos ouvir.
http://www.radioutrora.metodologica.info/2013/01/radioutrora-44-ulysses-galletti-hora-da.html
de 2:48 a 3:58 e de 3:59 a 6:10 (com PRK-30)
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Estátua de Oswaldo na Praça Saens Peña |
Um fato é correto: as pessoas deixaram de ser
sedentárias e passaram a se sentir melhor com as aulas de ginástica. O programa
mudou a vidas de muita gente. É lógico que repetiam as lições ufanistas ditadas
pelo professor. O curso fazia tanto sucesso que a Rádio Nacional, a emissora mais
popular do país, convidou Oswaldo, a partir de 1936, para dar aulas diariamente
a partir do microfone na Praça Mauá. Ocorreu um boom na cidade. Não havia quem
não conhecesse o programa, que teve reprises em outros horários. Todos o
adoravam e, por isso, chegaram a criar uma Associação dos Radioginastas.
Seguindo os conselhos que o professor dava durante as aulas eles faziam
campanhas para ajudar os pobres, recolhiam roupas e alimentos etc.
Porque a ideia era essa, ir além dos
exercícios. Mas também aprender a se alimentar corretamente, ter hábitos de
higiene, viver em harmonia na família e no trabalho. Durante as aulas, o
professor respondia perguntas e lia homenagens. Uma querida tia minha, tia
Sarah, falecida recentemente, adorava o professor. E, de herança, nas coisas
dela, encontrei uma carta que ela escreveu com uma letra muito caprichada em
homenagem a Oswaldo. Os radioginastas também juntavam dinheiro para comprar
presentes para o mestre. Já pensaram o quanto eles economizavam durante o ano
sem precisar pagar academias?
Para provar que a ginástica fazia bem mesmo,
Oswaldo Diniz Magalhães viveu até os 93 anos e ganhou de seus fãs uma estátua
de bronze que está até hoje na Praça Saens Peña, na Tijuca.
“Hora da ginástica” foi o programa que ficou
mais tempo no ar em uma rádio brasileira: 51 anos, sendo que 40 ao vivo. Um recorde. Depois da Nacional, o programa se
transferiu para a Rádio MEC e depois para a Rádio Globo, onde acabou. Nos anos
80, os jovens já não acompanhavam o rádio e tinham muitas academias para se
exercitar. Todos já tinham consciência de que os exercícios realmente são fundamentais
para uma vida saudável.
O internauta Sérgio Carvalho colocou à disposição do público na internet
uma biografia de Oswaldo, com vários
capítulos que valem a pena ser lidos. Muitos
jornais e fãs escreveram sobre a importância das aulas e dos conselhos de
Oswaldo Diniz Magalhães. João Coelho Netto, por exemplo, em um de seus artigos,
disse o seguinte:
"Quantos enfermos ele curou, quantos envelhecidos ele rejuvenesceu,
quantas almas vencidas ele animou!"
Segundo a Revista Antena, de
1935, Oswaldo Diniz Magalhães era o atleta do microfone. O articulista do jornal A Noite,
na coluna Rádio de Humpty-Dumpty, de 1937, escreveu o seguinte: “Este professor
de gymnastica ritmica pelo rádio,
único no Brasil, não tem alunos dentro do studio,
mas tem o Brasil inteiro dentro do studio”.
O jornal A Nação publicou na Secção Rádio, em 1938, que “a obra de
Oswaldo Diniz Magalhães é grandiosa sob todos os aspectos. Acordar milhões de
brasileiros todas as manhãs e ensinar-lhes exercícios para conservar a saúde e
o bom humor; despertando-lhes a consciência para o cumprimento do dever para
consigo mesmos; enchendo de fé os descrentes e que já se consideram vencidos;
dotando a cidade e o paiz inteiro de
novos hábitos, somente com a palavra cheia de sentimentos patrióticos, não é
para qualquer um”.
Não consigo acessar o audio.
ResponderExcluirNem eu
ResponderExcluirA minha família durante bom tempo, do final de 1940 à meados de 1950, participou das aulas do professor Oswaldo Diniz Magalhães, logo cedo, ao se levantar da cama. Creio ser uma das razões de mesu pais viverem mais de 90 anos. Eu estou com 77. Espero chegar lá.
ResponderExcluirMuito boa matéria - obrigado por divulgar.
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