Rose Esquenazi
https://www.youtube.com/watch?v=fD8Hh4CFPkk Na subida do
morro, Moreira da Silva, de Geraldo Pereira
O cantor Ciro Monteiro, um cantor maravilhoso também, mas completamente
diferente do primo Cauby Peixoto. Antes, Ciro – conhecido como Formigão - só
cantava em casa e para os amigos, mas, aos poucos, ele começou a ser convidado
para se apresentar nas estações de rádio. Sua estreia foi com um
samba Acabou a sopa, de
Geraldo Pereira e Augusto Garcez, em 1940.
Criador de mais de 100
músicas, Geraldo compôs um dos grandes sucessos interpretados por Ciro
Monteiro, A Falsa Baiana,
de 1944. Estudiosos acham que essa música influenciou o nascimento da Bossa
Nova devido a sua batida. O escritor Luiz Fernando Vianna afirma que “o ritmo
não apenas acompanha a melodia, mas forma com ela um conjunto indissociável”. O
estudioso de MPB Jairo Severiano considera Falsa
Baiana como “obra prima, samba paradigma de seu estilo”. (“Uma história da
Música Popular Brasileira”)
Ciro trabalhou na Rádio Philips e na Mayrink Veiga e influenciou muitos sambistas. Nascido em 28/5/1913 (morreu em 13/7/1973), além de cantor, era também foi compositor.
Já o compositor Geraldo Theodoro Pereira, de quem
falamos agora, nasceu em 1918 (1955), em Juiz de Fora, teve infância difícil.
Ele se mudou para o Morro de Mangueira, onde ficou amigo de outros
compositores, como Cartola e fez parte da extinta escola de samba Unidos de
Mangueira. Casou-se a contragosto com a mãe de seu filho e logo depois partiu
para a vida boêmia, com bebida demais, mulheres demais e brigas demais. Sem
tocar nenhum instrumento, compunha usando uma caixinha de fósforos para
acompanhar o ritmo. Começou a fazer samba sincopado, um samba leve e cheio de
divisões rítmicas, inovando a música popular brasileira. Estreou como
profissional em 1939 e deixou 76 músicas gravadas, cerca de 90% sincopadas.
Outras músicas muito conhecidas de Geraldo Pereira também foram
interpretadas por Ciro Monteiro, tais como Escurinho e Pisei no
despacho.
Desde 1931, o samba batucado feito pelos compositores negros e mestiços do
Estácio já incluíam um pequeno breque, que é aquela paradinha que permite “uma
modulação para a retomada da melodia da primeira parte”, como ensina José Ramos
Tinhorão, no livro Pequena História da Música Popular (Vozes, 1974). O breque virou moda
principalmente entre a dupla Ismael Silva e Nilton Bastos. Pode ser entendida
também como o breque de um carro, quando o automóvel para de repente.
A principal característica do estilo é a pausa no acompanhamento acentuadamente sincopado para uma intervenção declamatória do intérprete. Muitos compositores, como Heitor dos Prazeres, incluíam em suas letras escritas a expressão break, informando que, naquele momento da música, o cantor deve parar e dizer uma determinada frase ou cantar um determinado trecho musical.
Em Você está sumindo, com Jorge
de Castro, de 44, Geraldo Pereira fala que o amor de uma mulher está lhe
consumindo, o abandono o deixa decadente. Na frase musical, a síntese da
situação: “Você está acabado, chi! Você está sumindo”.
O maior expoente do samba brecado foi Moreira da Silva, justamente com um
samba de Geraldo Pereira com a coautoria de Moreira da Silva: Acertei
no milhar, de 1940.
Acertei no milhar é, na minha opinião, uma música genial. Conta o sonho que
uma pessoa comum tem ao ganhar uma fortuna no jogo do bicho. Manda a mulher
quebrar os móveis, dar as roupas todas aos pobres, pretende colocar os filhos (“ai,
que inferno!”, ele diz) no colégio interno, vai comprar um título de nobre e
viajar pela Europa e América do Sul. Tudo maravilhoso, com muito dinheiro no
bolso, até que a mulher do sujeito, a Etelvina – olha que nome delicioso – o
acorda dizendo que estava na hora do batente, ou seja, ele precisava trabalhar.
O samba acaba com a triste frase: “Foi um sonho, minha gente”.
Conhecido como o Rei do Breque, Moreira da Silva interpretou diversas músicas de Geraldo Pereira Na subida do morro, que ouvimos no início do quadro. Conhecido
como Kid Morengueira, Moreira da Silva viveu até os 98 anos e
fez shows até os 90. Nascido no Morro do
Salgueiro, na Tijuca, em 1º de abril de 1902, morreu em 6/6/2000. Trabalhou em
fábricas, foi taxista
e condutor de ambulância. Nas horas vagas, Kid cantava. E foi fundo
na improvisação de frases engraçadas, ditas de maneira muito rápida. As pausas
do breque evoluíram para o samba brecado.
Essa turma, muitas vezes, era
identificada com a malandragem da Lapa, comportamento malvisto pelo Estado Novo
de Getúlio Vargas. Moreira da Silva se vestia de terno branco, usava chapéu de
palha e sapatos impecáveis.
Já Geraldo Pereira não se vestia
assim. Mas fazia pose e vivia bebendo nos bares e resturantes da Lapa. Teve uma
morte estranha e com muitas versões. Segundo Madame Satã, o malandro que jogava
muito bem capoeira e era travesti temido pela polícia, Geraldo, certa noite, implicou
com ele. Insistiu que Satã bebesse do chope dele e, depois, queria beber do
copo de Satã. Houve um desentendimento feio, eles começaram a brigar na porta
do Restaurante Nova Capela, no Centro. Geraldo caiu no meio fio e bateu com a
cabeça. Morreu aos 37 anos. Outra versão é de Luiz Fernando Vianna, que conta
que Geraldo já sofria de hemorragia intestinal há muito tempo. (Olha o meu
break: também depois de tanta bebida!) A causa
mortis não teria sido a batida da cabeça no meio-fio.
José Ramos Tinhorão ensina que o
samba-de-breque tinha sumido um tempo até reaparecer nos anos 50 através das
composições de Miguel Gustavo. Autor de O Rei do Gatilho, 1962, interpretado
por Moreira da Silva, e de Café
Society, de 1955, o publicitário explicou em uma entrevista que, na
verdade, ele e Billy Blanco, apenas trouxeram o samba de breque para “convívio
da classe média”. “Naquela mesma ocasião, muitos outros continuavam a fazer esse
tipo de samba, do jeito deles e para o seu próprio público, com as ferramentas
rudimentares que possuíam”, explicou Miguel Gustavo, que continuou com a
explicação: “Nós alteramos a coisa um pouco. Colocamos nosso tipo de vida,
nossas observações e nossa formação num tipo de estrutura antiga e
restrita.” (Veja, 1980)
Vamos ouvir Café Society com Jorge Veiga (1910-1979), que nasceu no bairro do
Engenho Novo e foi muito pobre. Engraxate, vendedor de frutas e pintor de
paredes, foi descoberto em programa de calouros da Rádio Educadora do Brasil
(PRB-7). Regravou com muito sucesso Acertei no milhar, de que falamos no
início do porograma. Vamos ouvir Café
Society?
https://www.youtube.com/watch?v=CoovSvHmCL8 Jorge
Veiga canta Café Society.
Esse
quadro com você, Marcus Aurélio, do Rádio Faz História, minha gente, não foi um sonho.
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