Em um quadro
anterior, contei um pouco da história do criativo e maravilhoso radialista
Almirante, pseudônimo de Henrique Foréis Domingues. Entre os 40 programas
originais que ele criou para as rádios Philips, Nacional, Tupi e Rádio São
Paulo, está o programa INCRÍVEL,
FANTÁSTICO, EXTRAORDINÁRIO, seu maior sucesso, não há dúvida, que ele começou a
escrever aos 39 anos. Segundo Sérgio
Cabral, que escreveu No tempo de Almirante, uma história do Rádio e da MPB, esse
programa encerrava a série Histórias das Orquestras e Músicos do Brasil.
Hoje vamos nos
concentrar nessa atração que chamou tanta atenção do público. Temos um bom
motivo para fazer isso: os diretores João Velho e Rico Cavalcanti estão rodando
um filme sobre Almirante. Justa homenagem ao homem que criou o primeiro
programa montado do rádio brasileiro. Para explicar melhor: o primeiro editado,
trabalhado, perfeitinho, que ainda não havia nos anos 30, no Brasil. Almirante
profissionalizou o rádio e foi copiado por todos os outros produtores a partir
dele.
Almirante nasceu no
Rio de Janeiro em 1908 (morreu em 1980). Em 1947, na Rádio Tupi, convidou o
público para contar as suas próprias e estranhas histórias. Mas, antes, a sua
equipe confirmava a veracidade de cada relato. Cada colaborador tinha que enviar
o endereço e telefone e, caso fosse montada o causo, como eles chamavam, a
pessoa ganharia um pequeno cachê. Almirante tinha uma equipe de radioatores,
como a atriz Ida Gomes, uma pequena orquestra e sonoplastas, para dar o clima
certo ao relato. Tudo ao vivo, naturalmente. Centenas de histórias foram
enviadas e produzidas. Tornou-se um programa muito popular. Almirante recolheu
centenas de casos até 1958.
Vamos ouvir a
abertura?
Almirante era muito
organizado e guardou todos os relatos que depois foram reunidos em um livro,
com o mesmo nome do programa, editado pela Editora Francisco Alves, em
1989. Vamos ouvir o primeiro trecho de
um dos programas que teve o patrocínio de Guaraína, remédio que combatia a dor de dente, a dor de
cabeça e resfriados sem atacar o coração, segundo o anunciante. Foi ao ar no
dia 9 de dezembro de 1947.
https://www.youtube.com/watch?v=b3N02UjV41E
INCRÍVEL,
FANTÁSTICO, EXTRAORDINÁRIO era uma ideia antiga inspirada em um fato que
aconteceu quando Almirante era criança. No chalé onde a família foi morar em
Nova Friburgo, fenômenos estranhos aconteciam diariamente. Havia barulhos
incompreensíveis, a luz acendia e se apagava, as venezianas batiam sozinhas.
Incrédulo, o pai chamou o vizinho para confirmar aquilo tudo. Naquele dia,
todos presenciaram as xícaras de cafezinho se espatifarem no chão sem que
ninguém tivesse provocado aquilo.
Almirante dava um
alerta para as pessoas mais impressionadas. Ele dizia: “Não se assustem,
ouvintes, mas será um programa em que vamos apresentar o sobrenatural sem
tentar explicar coisa alguma e sem o menor propósito de fazer com que vocês
acreditem nos fatos verdadeiramente fantásticos que ocorrem n o dia a dia de
muita gente”.
A vinheta era
espetacular e metia muito medo. Almirante avisava que não era preciso temer
nada porque quase todo o mundo tinha casos extraordinários para contar de suas
famílias e amigos. Coincidências, aparições, avisos, sonhos, mensagens, pessoas
mortas que voltavam ao mundo dos vivos e até se casavam, defuntos que se
vingavam dos amigos.
As crianças eram
proibidas de ouvir o programa que era irradiado tarde da noite. Os pais achavam
que os filhos teriam pesadelo. Mas assim que os pais saíam de casa, as crianças
corriam para o rádio para ouvir, às escondidas, o programa que metia medo. Anos
mais tarde, esse programa foi levado várias vezes para a TV e o título do
programa se tornou uma expressão
corriqueira no nosso vocabulário.
Algumas histórias correram
até no começo do século passado e eram lembradas pelos filhos e netos. Depois
de confirmadas, Almirante dirigia a sua equipe e levava ao ar a história com
muita emoção e interpretação. Talvez por isso, havia um culto, entre as famílias
e moradores de pequenas e grandes cidades, de conversar sobre as estranhezas do
lugar onde habitavam. No caso do programa, lemos que uma pomba acompanhou o enterro de uma boa
professora, o noivo que se casou mesmo depois de sua morte.
Havia muitos milagres
de santas, assim como castigos para aqueles que cometiam maldades. Parece que
os mortos costumam fazer justiça com as próprias mãos, mas também ajudam na
cura de alguma criança. Tudo era incrível, fantástico e extraordinário. Graças
ao sincretismo religioso, o brasileiro mistura várias religiões e costumamos
acreditar em quase tudo. Você tem alguma história incrível para contar, Marco
Aurélio? E os seus ouvintes?
relembrando esse passado no qual eu era ouvinte assíduo e com todos os medos descritos no comentário , só uma coisa me surpreendeu, pois jurava o programa era transmitido pelo Nacional e não pela Tupi. A sonoplastia era também fundamental na criação do frenesi do medo, coisa que nessas reproduções não me parece as mesmas. Ilusão , talvez, de minhas longevas lembramças. FORMIDAVEL.
ResponderExcluirquantos episódios foram levados ao ar na rádio e depois na tv globo? não encontrei nenhuma lista de episódios, ou qualquer referencia maior as histórias. Onde posso conseguir o livro, mesmo em arquivo pdf?
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