segunda-feira, 27 de julho de 2015

Pixinguinha: o mais maravilhoso músico brasileiro



Rose Esquenazi








Hoje vamos falar de um gênio da música. Ele foi e é um mito, um talento, uma alma maravilhosa. Pixinguinha, ou melhor, Alfredo da Rocha Vianna Junior, nasceu em 1897, no Rio de Janeiro. Morreu no dia 7 de fevereiro de 1973, dentro de uma Igreja em Ipanema, durante um batizado. Virou santo para quem ama a música universal!

       É muito bom saber que Pixinguinha está mais vivo do que nunca. O Instituto Moreira Salles lançou dois livros com as partituras da segunda fase do mestre, além de manter o seu arquivo musical. No acervo, cedido em comodato pela família, há documentos, medalhas, troféus, álbuns com recortes de jornal, centenas de fotos, roupas, registros de memória oral. Além do Instituto, cotidianamente, os jovens estudam a música de Pixinguinha na Escola Portátil de Música e em várias outras escolas Brasil afora.

Vamos falar de Pixinguinha. A primeira música que ouvimos foi O urubu e o gavião, com o músico na flauta, em 1933. Procure ouvir  Naquele tempo, de 1934.


O pai de Pixinguinha trabalhava nos Telégrafos, mas, nas horas vagas, era músico e costumava reunir os amigos chorões. O menino Alfredo absorvia todos os sons daqueles magníficos intérpretes e os reproduzia com perfeição em uma flautinha artesanal, feita de folha.  Quando o pai mandava o menino dormir, lá pelas nove horas, ele continuava ouvindo a música. Mas ele também conhecia os tambores do fundo do quintal.  A avô era africana, tinha terreiro e deu ao neto o apelido de Pinzindim, menino bom na língua nativa. Parece que foram os amiguinhos que acertaram o nome de Pinzindim para Pixinguinha. O músico ficou cheio de buracos no rosto devido à varíola. 

Há alguns mitos e mistérios em relação à história de Pixinguinha. Três irmãs disseram que ele nunca teve avó africana. E agora?  Bem, dona Raimunda, mãe de Pixinguinha, teve 14 filhos de dois casamentos. A casa estava sempre lotada e era muito musical. Quando tinha 11 anos e ainda usava calças curtas, ele compôs a primeira música, chamada Lata de leite.

     Já as primeiras participações em grupos de chorões foram com os amigos do pai. Depois, fez parte de um grupo de samba que começou em 1917, ainda sob forte influência do maxixe. Segundo o pesquisador Jairo Severiano, Pixinguinha passou pelo Rancho Filhas da Jardineira. Tocava também na Lapa, na casa de chope A Concha e, dali, foi um pulo para entrar no Teatro Rio Branco. Tanto Jairo Severiano quanto o pesquisador Henrique Cazes, que escreveu o livro Choro: do quintal ao Municipal, as primeiras gravações foram na Casa Edison, em 1914.  Três anos depois, o grupo “Pechinguinha” (sic) gravou, na Gravadora Odeon, alguns choros, entre eles, Rosa. Ouça a música na voz de Orlando Silva.


Foi na sala do Cine Palais que os cariocas da elite conheceram Pixinguinha e se encantaram com os sons da flauta. O milionário Arnaldo Guinle decidiu patrocinar a viagem à Europa do grupo, chamado de Os Oito Batutas. Os estrangeiros precisavam conhecer a nossa música. No dancing Sherazade, o grupo atraiu os parisienses que os chamavam de batutás.  Durante seis meses, eles participaram dos alegres anos 20. Henrique Cazes acha que os Batutas não fizeram tanto sucesso porque, se esse fosse o caso, teriam gravado discos. Fazia frio na Europa e os rapazes decidiram voltar. Com algumas deserções, foram depois para Buenos Aires, onde realmente brilharam e gravaram discos. 

         De volta ao Rio, os Batutas continuaram  até 1926, quando Pixinguinha passa a integrar a Companhia Negra de Revistas. Era inédito um grupo de negros se unir para trabalhar junto. Nesse ano, ele também se casou com Jandira Aimoré, com quem ficou junto até a morte, em 1973.

Nos anos 30 e 40, na mesma época do genial Radamés Gnatalli, Pixinguinha foi mestre na vida das orquestras e pioneiro nos arranjos. Muitos cantores famosos se beneficiaram da arte de Alfredo da Rocha Vianna. Posso citar algumas músicas famosas, como O teu cabelo não nega e Na virada da montanha. Pixinguinha começou a criar orquestras, a trabalhar em outras gravadoras, dancings e emissoras de rádio.  Ele passou pela Rádio Transmissora,  que era ligada à Gravadora Victor. E também pela Mayrink Veiga, Nacional, Tupi, Rádio Club e Record, de São Paulo.  Na Mayrink, Pixinguinha criou o conjunto regional Os Cinco Companheiros.  Em 1933, cursou oito meses de teoria musical na Escola Nacional de Música, obtendo diploma.  Mas nem precisava!

Clássico dos clássicos é a música de Pixinguinha, Carinhoso. O choro-canção ficou sem letra durante um tempão. Até que João de Barros criou a poesia que combinou muito bem com a sonoridade.  Pixinguinha passou da flauta para o saxofone na década de 40. Dizem as más línguas, que ele havia perdido a embocadura do instrumento devido ao excesso de bebida. De fato, ele gostava muito de beber.  Sumiu um tempo e, nos anos 50, houve a redescoberta de Pixinguinha. O gênio do sax criou a Turma da Velha Guarda.

Em uma entrevista, dia 29 de maio de 2015, com Henrique Cazes, ele contou que Almirante sempre levava Pixinguinha para o rádio em tempos de vacas magras.  Na Tupi, o radialista anunciava que o amigo tinha feito os arranjos de determinadas músicas.  E juntos apresentavam o programa O pessoal da velha guarda. Em 1953, Pixinguinha se tornou diretor musical na Rádio Club.

Mas, do tempo em que era líder da vanguarda  passando mais tarde a líder da Velha Guarda, Henrique Cazes acredita que Pixinguinha não foi bem recebido pela classe média. Para ele, havia preconceito racial. Não se acreditava que um negro fosse “capaz de organizar bem as coisas, de ser um estruturador. Pelo contrário”,  acreditava Cazes, “os músicos negros eram considerados espontâneos e improvisadores. Curiosamente, foi a elite quem deu força para os Oito Batutas irem para a Europa, muitos anos antes.

Nos anos 60, Pixinguinha foi parceiro de Vinicius de Moraes, em Lamentos, trilha do filme Sol sobre a Lama, de Alex Vianny. Foi parceiro também de Hermínio Bello de Carvalho, em Fale Baixinho, música escrita no hospital. 

Na entrevista dada por Pixinguinha ao radialista Vanderlei Malta da Cunha, na Rádio Metrópole AM, em Porto Alegre, em 69, ele reclamou sutilmente da onda do iêiêiê, que estava bombando. Não gostava dos músicos fantasiados nos festivais e achava a música de Chico Buarque “sempre a mesma coisa”. Ele preferia as letras do compositor. A descoberta do áudio foi da repórter Mariana Filgueiras, em uma reportagem do dia 15 de maio de 2015, no Globo. Nos anos 60, Pixinguinha andava meio esquecido e, no fundo, queria a volta dos chorões, queria compor e tocar. Fez questão de avisar os ouvintes:  “Mas o mundo é uma bola, daqui a pouco, o choro volta”. Ele tinha razão. Para terminar, ouça o choro Vou vivendo. Pixinguinha no sax e Benedito Lacerda, na flauta, em uma gravação de 1946. Benedito era o grande parceiro e amigo de Pixinguinha.


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