terça-feira, 7 de agosto de 2018

Altamiro Carrilho : o maior flautista brasileiro





Rose Esquenazi

     A cidade de Santo Antônio de Pádua, no Norte Fluminense,  parou no dia 15 de agosto de 2012. O filho mais famoso da terra, Altamiro Aquino Carrilho, ia ser enterrado ali, aos 87 anos. Considerado o maior flautista brasileiro de todos os tempos, Altamiro chegou a ganhar um grande elogio do flautista francês Jean Pierre Rampal. Para ele, Altamiro Carrilho era o melhor flautista do mundo.
     Os instrumentistas têm tudo a ver com a história do rádio porque, nos estúdios das emissoras, eles mostraram pela primeira vez seu dom e talento. Ouvimos,  no início do quadro, um trecho da música Carinhoso, de Pixinguinha, uma obra-prima que também se adaptou perfeitamente à flauta de Altamiro Carrilho. Essa música foi um de seus carros-chefes na extensa carreira.
     Certa vez, perguntei a Altamiro, já velhinho, na Escola Portátil de Música, na Urca, como foi o começo dele no rádio. E ele contou que durante o primeiro teste, ele tinha que segurar a flauta velha com cuidado porque estava toda presa por elásticos.  Além de músico, Altamiro Carrilhofoi também compositor e deixou para posteridade mais de 200 músicas.
     Mas vamos contar como tudo começou. Em 1938, aos 14 anos de idade, Altamiro Carrilho fez parte da Banda Lira de Arion, fundada pelo avô. A família toda era apaixonada por música, tanto que a mãe se chamava Lira. O rapaz era responsável pelo som que saía da caixa de guerra, que instrumento é esse? Não faço ideia. Nessa época, os Carrilhos se mudaram para Niterói buscando novas oportunidades de trabalho. Enquanto ganhava um dinheirinho sendo farmacêutico, Altamiro estudava música.

     Também aos 14 anos, Altamiro se apresentou no programa de Ary Barroso, o Calouros em desfile, no Rio de Janeiro. Ary era o animador mais exigente de todo o rádio brasileiro, além de ser um tanto mal-humorado. Mas ele se rendeu ao talento do rapaz, ao som de sua gaita presa com elásticos e lhe deu o primeiro prêmio. Depois disso, Altamiro comprou outra flauta de segunda mão e não perdia os programas de Dante Santoro e Benedito Lacerda, dois grandes instrumentistas. Como ele tinha grande facilidade para improvisar, acabou sendo contratado na Rádio Nacional.

     Altamiro passou a acompanhar grandes cantores como Orlando Silva, Vicente Celestino e Francisco Alves. O som de sua flauta fazia toda a diferença no resultado final.
Uma história curiosa aconteceu quando o flautista notou que havia um novato em Niterói, apresentando, no rádio, um programa muito animado. Era um tal de Abelardo Barbosa, ainda desconhecido, e seu horário era tão simples que não tinha sequer prefixo musical. Por amizade, Altamiro compôs Flauteando na Chacrinha, que passou a abrir os programas da Rádio Clube de Niterói. Ouça no YouTube Flauteando na chacrinha

     Aos 19 anos, Altamiro Carrilho gravou seu primeiro disco ao lado do sambista Moreira da Silva. Na época, anos 40, ainda era raro ver um instrumentista galgar os primeiros lugares nas paradas de sucesso. Mas, ao lado de famosos músicos, isso era possível. A fama de bom flautista já era conhecida e por isso foi contratado para tocar na orquestra da Rádio Sociedade Fluminense. De lá para a Rádio Tupi foi um pulo, agora como integrante dos conjuntos de César Moreno e depois de Rogério Guimarães.

     Em 1950, Altamiro formou seu primeiro conjunto e atuou na Rádio Guanabara. Um ano depois, o músico Canhoto o convidou para fazer parte de seu regional. Na ocasião, substituiu Benedito Lacerda, grande referência na Rádio Nacional.

     Em 1956, Altamiro teve uma ideia genial:  formou a Bandinha de Altamiro Carrilho, com a qual gravaria dezenas de discos. Ele não fazia sucesso só no rádio, mas também na TV Tupi, no horário nobre. Certamente ele influenciou o público jovem que tentava uma carreira na área musical. A bandinha funcionou até 58 no programa Em tempo de música, de grande audiência.

     Altamiro teve o dom de redescobrir o choro. Durante um tempo, o gênero musical esteve em baixa, mas passou a ter crescente interesse graças a atenção e as gravações do flautista. Há muitos anos está em alta, valorizada e considerada como o mais brasileiro dos ritmos. O maxixe Rio Antigo, de  autoria de Altamiro, que vamos ouvir a seguir, chegou a vender 960 mil cópias, em 1960. Se era um fenômeno na época, ainda hoje seria considerado um recorde.  A música foi composta para comemorar os 400 anos da fundação do Rio de Janeiro, em 1965. Ainda faz parte do repertório dos músicos que cultuam o choro. 

     Altamiro Carrilho começou a fazer turnês internacionais nos anos 60 e 70. Viajou para Portugal, Espanha, Inglaterra, França, Estados Unidos, Alemanha.
As semanas que iria tocar no México se transformaram em um ano inteiro de apresentações. Foram três meses na Rússia e, em Israel, as pessoas lotaram a sala de concerto.

     Foram tantos os pedidos, que Altamiro resolveu fazer um segundo show em seguida, com poucos minutos de intervalo. O esforço era para apaziguar os amantes da música e da flauta do brasileiro. Em 1987, Altamiro acompanhou a cantora Elizeth Cardoso ao Japão, fazendo com que os japoneses passassem a amar ainda mais a música brasileira.

     De volta aos setenta, Altamiro teve uma grande sacada ao incluir pequenas cadências da música popular brasileira no Concerto em Sol de Mozart. Deu certo.  Ele continuou a mostrar o talento em unir o clássico e o popular no Teatro Municipal, onde o público o aplaudiu de pé durante 10 minutos. Altamiro gravou dois discos em que mostrava essa arte. Com os Clássicos em Choro, o músico pôde comemorar em 1997 o Prêmio Sharp. Altamiro ganhou muitos outros prêmios, sendo o primeiro o Troféu Microfone de Ouro, instituído pela revista Radiolândia. O presidente Fernando Henrique Cardoso, em reconhecimento à luta de Altamiro em defesa da música, lhe conferiu a Ordem do Mérito Cultural, em 1998.

     Altamiro Carrilhofoi o flautista que teve o maior número de gravações registradas na história do disco no Brasil. Mas sempre se manteve humilde e carinhoso com todos que se aproximavam deles. O irmão Álvaro também era músico e começou tocando choro em uma pequena flauta de bambu. Os  filhos de Álvaro, César e Maurício, deram continuidade ao amor à música. Todos foram responsáveis pela fundação da Escola Portátil de Música e, depois, da Casa do Choro. Nesses dois lugares, se pode ouvir e aprender instrumentos musicais sempre ligados ao chorinho!Mas, para quem quiser, pode participar das oficinas de música de Carnaval 2018. É só se inscrever no www.escolaportatil.com.br. Até o dia 11 de janeiro.

    Vamos terminar com um clássico o Pour Elise, de Beethoven, com o som da flauta incrível de Altamiro Carrilho. Genial!



Nenhum comentário:

Postar um comentário