quarta-feira, 8 de agosto de 2018

Lourival Marques: grande redator do rádio



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Rose Esquenazi      
     O programa Rancho Alegre, veiculado na Rádio Nacional do Rio de Janeiro nos anos 1950, com Emilinha Borba, foi escrito pelo pesquisador, produtor e diretor artístico da Nacional, Lourival Marques. Mas será que algum ouvinte do seu programa, Marcus Aurélio, ainda se lembra dele, esse gênio do rádio? Esse é um problema da nossa época, não nos lembramos de grandes nomes, trabalhadores incansáveis e criativos, que fizeram o rádio brilhar durante muitas décadas.

     Lourival Marques nasceu em Juazeiro do Norte, Ceará, em 15 de novembro de 1915. Filho do jornalista Sebastião Marques, teve a incrível oportunidade de ver, em sua formatura no Grupo Escolar, o Padre Cícero, ele mesmo, em carne e osso. Muito jovem, Lourival começou a descobrir o poder das ondas sonoras no Centro Regional de Publicidade, que reunia 18 alto-falantes em Juazeiro do Norte. O sistema veiculava notícias, informações de utilidade pública e comerciais.

     Em 1943, já estava trabalhando na Ceará Rádio Clube, em Fortaleza. Criou os primeiros formatos de programa que iria adotar mais tarde na Rádio Mayrink Veiga, no Rio de Janeiro. Ele foi contratado em 1945. Nessa parte da história, também constatamos que não foi preservada a memória dessa grande emissora brasileira que teve a sua sede lacrada no Centro da cidade. Resultado de um ato do governo militar, todo o acervo da Mayrink Veiga desapareceu por completo. Uma pena. Entre as 20 atrações que Lourival Marques produziu na Rádio Mayrink Veiga, vamos citar “Recordações em Desfile”, sem nenhum registro sonoro ou escrito.

     Em 1950, Lourival Marques foi contratado pela Rádio Nacional e entrou para um timaço de redatores. Mário Lago, Paulo Gracindo, Hélio de Soveral e muitos outros. Na lista dos programas de Lourival está “Seu Criado, Obrigado”. No depoimento do apresentador e radio-ator Gerdal dos Santos, ainda hoje funcionário da Nacional, e um dos famosos contrarregras da era das novelas, ele citou Lourival Marques. Mas teve dúvidas sobre a participação do roteirista, que confirmo aqui. Durante muitos anos, a partir de 1953, Lourival Marques foi também colaborador da Revista Radiolândia, assinando a coluna “Dicionário da Gente do Rádio”. 
     Em 1963, Lourival escreveu um livro com o mesmo título do programa, que consegui comprar em um sebo: “Seu Criado, Obrigado”. Em 12 anos, ele reuniu centenas de perguntas dos ouvintes que o Criado, no caso, ele mesmo, respondia. Mas a voz era de César Ladeira e a secretária do programa, vejam só, era a radialista Daisy Lúcidi. Na Nacional, Lourival Marque tinha, além de uma vasta biblioteca, recortes de jornais, revistas e as mais variadas publicações para ajudá-lo nas pesquisas. Nem é preciso dizer que não havia Google, Internet ou computadores na época, não é?

As perguntas dos ouvintes eram curiosas. Por exemplo: “Odete Ramalho, de Petrópolis, Estado do Rio, queria conhecer o nome da primeira pessoa a medir a pressão arterial”. O criado respondeu: “Foi um sacerdote, o reverendo inglês Stephen Halles, em 1744. Baseado em observações de Harvey e em outros estudos, usou Halles, naquela prova, um manômetro de sua invenção”.

Outras perguntas: “Qual é a mais alta montanha do mundo”, “A mais antiga emissora de rádio do mundo”, “Por que sofremos mais com o frio do que com o calor”. E por aí vai.

Outro programa famoso de Lourival Marques foi o “Superflit”. Patrocinado pelo veneno muito popular para matar insetos, antigamente, era a garantia de estabilidade de Lourival Marques no rádio. Como disse anteriormente, foram muitos programas escritos por ele, muito culto e caprichoso. Pois bem, com o tempo, mostrando todo o seu talento, se tornou diretor artístico da Nacional, na época de ouro da emissora.

Encontrei algumas citações sobre esse grande profissional nos blogues de Jota Alcides e Renato Casimiro no Google, mas não há ainda uma biografia alentada sobre ele. Nem sei quando morreu o autor dos seguintes programas radiofônicos: "Bahia dos meus amores", "Dicionário dos Extremos", "Brasil país dos mil ritmos", "A música e o Dia", "Gente que faz a gente cantar", "Radio Revista", "Em cima do Fato", "Clube das donas de Casa".

Um dos grandes destaques foi a atração “A Canção da Lembrança”, que teve como locutores os radialistas Jorge Cury e Reinaldo Costa, O patrocínio era de Phimatosan, o “tônico poderoso". Em uma entrevista que concedeu em 1948, ao jornal Noite Ilustrada, Lourival Marques disse que era um dos mais lindos programas noturnos da Nacional, de extremo bom gosto”. Mais tarde, ele se transferiu para a Rádio Globo, onde apresentou “Cenas Brasileiras". Ter seu próprio patrocinador, no caso Phimatosan, lhe dava a segurança de continuar trabalhando naquilo que mais gostava: o rádio! Ouça, no YouTube, o jingle do Phimatosan.

     Na introdução do livro “Seu criado, obrigado”, Lourival Marques diz que não é tão fácil escrever para o rádio. Nas palavras dele: “Nem todos se são conta dessa apreciável diferença entre a linguagem literária dos livros e o texto simples dos programas de rádio. Não foram poucos os grandes nomes da literatura nacional que naufragaram na tentativa de escrever para o microfone, de expor suas ideias na palavra fácil que vai direto ao povo”.

    Muita gente dizia para ele: “escreva como fala. Ponha no lixo os acentos desnecessários”. OK, pode dar certo. Mas o desafio aceito por Lourival Marques ao escrever um livro foi o oposto: “transportar o texto radiofônico para o livro”, segundo ele, “era tarefa muito mais difícil de ser realizada”.

4 comentários:

  1. Caríssima Rose: somente hoje encontrei esta matéria, bem como o áudio que foi veiculado no programa, com seu palavra. Meu interesse por Lourival Marques de Melo é muito grande porque ele foi colega de formação primária de minha mãe, ainda garotos no Juazeiro do Norte, no Grupo Escolar Padre Cícero, exatamente em cerimônia onde eles dois e outros mais receberam o certificado de conclusão do então primário, pelo próprio Pe. Cícero. Isto está mencionado num livro de memórias da antiga diretora desta Escola. Por muitos anos, mesmo se transferindo para o RJ, Lourival mantinha correspondência e visitava os amigos. Então, agradecendo a sua menção pública, no que me envaidece, digo que devo continuar o trabalho e publicar este livro. Grato por sua atenção.

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  2. Rose: Quando você diz: "Nem sei quando morreu..., essa é uma questão bem difícil de esclarecer, com precisão. Procurando no acervo da Biblioteca Nacional, o máximo que encontrei foi: No caderno Revista Nacional, encartado na edição 189 do Jornal do Commercio (RJ), de 20.05.1990, através da coluna de Televisão de Fernando Lobo, há a seguinte nota: "Perdas. A TVE perdeu neste mes dois dos seus mais destacados elementos: Lourival Marques, um pesquisador e editor de alta qualidade, vindo dos grandes tempos do rádio, e ainda o comentarista Ruy Porto, que fazia parte da equipe esportiva daquela emissora." (E nada mais).

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  3. Rui Porto faleceu de infarto em 04.05.1990. Tudo faz crer que Lourival Marques também finou-se por este começo de maio de 1990.

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  4. Obrigado, doutor, só poderia falar isso. Aqui Eduardo Marques, um dos 3 filhos do Grande Lourival. Estava quase diariamente na sala do 20o. andar na Rádio que deverá defenestrada pela União por esse tempos. Pena. Faz parte da história como o museu da quinta e outros bens abandonados...teleteatro, grandes cantores e o louro calmo e silencioso, bombando...a sala mais frequentada pela galera, cantores, cantoras, diretores, pequenos funcionários, etc. Saudades. Essa data está bem aproximada ou certa. O
    Ô já se passaram 30 anos. (sdsssss)

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