quarta-feira, 20 de dezembro de 2017

Adelaide Chiozzo, a namoradinha do Brasil

Rose Esquenazi


         Adelaide Chiozzo é instrumentista, cantora e atriz talentosa que tem  muitas marcas no rádio e no cinema brasileiro. Nascida no dia 8 de maio de 1931, no bairro do Brás, em São Paulo, foi criada dentro da colônia italiana. Desde os oito anos, ela revelou seu talento musical. O pai, Geraldo Chiozzo, era mestre-entalhador e marceneiro, seguindo nessa profissão durante toda a vida. Mas também era músico e tocava violão. Certa vez, a vida lhe deu presente inesperado. Não tendo como receber a conta de um serviço feito para a loja de música, Casa Gianninni, o dono sugeriu que ele levasse um instrumento como pagamento. Escolheu um acordeão alemão mas não sabia o que fazer com ele. Acabou trancando no armário.
        A filha Adelaide descobriu o tesouro e pediu para a mãe segurar as alças para ela. Muito menina, não conseguia fazer isso sozinha. Mesmo ralhando com a filha, a mãe segurou as alças, Adelaide abriu o acordeão e, em minutos, estava tocando a valsa Saudade do matão. A mãe não acreditou e chegou a cair no chão, quase desmaiada, dizendo que aquilo era um milagre de Deus.  Sem precisar de professor, a menina conseguiu tocar sozinha e assim, sempre que o pai saía, a mãe deixava que ela pegasse no acordeão.   
        Na família do marceneiro, o que não faltava era gente talentosa. Mas, de todos, Adelaidinha tinha ainda outro ótimo atributo: era muito bonita. Aos 11 anos, tomou coragem e foi fazer teste na Rádio Bandeirantes de São Paulo, no programa de Vicente Leporace. Solou no acordeão duas músicas, cumpriu as quatro etapas dos novatos e ganhou o primeiro prêmio almejado por todos os iniciantes. O melhor de tudo: depois de vencer os concorrentes, foi convidada a participar do programa sertanejo Na Serra da Mantiqueira, uma atração da rádio Bandeirante que ia ao todos os dias, às 8h da manhã.  Com medo do ambiente do rádio, mais livre e talvez perigoso para uma jovem, o pai mandou que o filho, Afonso, levasse também um acordeão para o rádio. Assim nascia o duo Os Irmãos Chiozzo.
         Como era comum naquele tempo, sucesso no rádio era sinônimo de excursões pelo Brasil afora. Nem todos os brasileiros tinham a felicidade de morar no Rio e m São Paulo, onde podiam assistir ao vivo aos shows dos artistas dentro de uma emissora de rádio. É bom que se lembre de que não havia ainda a televisão, o que surge no Brasil só a partir de 1950. Quando estava se apresentando na cidade mineira de Andradas, em 1945, uma cena marcou muito a jovem Adelaide. Assim que o rádio noticiou o fim da Segunda Guerra, os artistas e o povo saíram às ruas para cantar com alegria e alívio. 

           Ouvimos no início do quadro o baião Sabiá Na Gaiola, com Adelaide Chiozzo e Eliana Macedo. A música de Hervê Cordovil e Mário Vieira, foi gravada em 1950. Ouça o  sucesso de Adelaide Chiozzo, a valsa Beijinho doce, de Nhô Pai, de 1951. Talvez também tenha sido o destino que fez com que o pai de Adelaide Chiozzo decidisse se mudar com a família para Niterói. Lá ele abriu uma pequena fábrica de móveis. A família passou a escutar as rádios cariocas. No programa da Rádio Clube do Brasil, Papel Carbono, de Renato Murce, os candidatos precisavam imitar um artista de talento para vencer o prêmio do apresentador.

               Adelaide foi indicada pelo compositor Irani de Oliveira e juntos decidiram que ela deveria imitar a figura gauchesca do cantor e acordeonista Pedro Raimundo, cantando a sua conhecida música Adeus Mariana. Mais uma vez, todos ficaram encantados com a jovem e, além do prêmio, Adelaide passou a fazer parte do Regional de Dante Santoro, um dos mais conhecidos do Brasil. Nesse grupo, ela pôde provar que podia também cantar e não só tocar acordeão. 

                A cantora se transformou em uma atriz muito cultuada na Atlântida Cinematográfica.  Tanto que participou de 23 filmes, alguns deles musicais com atores consagrados como Oscarito e Grande Otelo. Em 1946, estreou no cinema atuando na comédia Segura esta mulher, contracenando com o pai, Afonso Chiozzo. Esses dois filmes foram dirigidos por Watson Macedo. No cinema, ela contracenou algumas vezes com a maior atriz brasileira, Eliana Macedo, que foi casada com Renato Murce, pioneiro do rádio no Brasil.
                       
                                Em 1947, mais uma vez, o pai atuou com Adelaide na comédia Esse mundo é um pandeiro, de Watson Macedo.  Já no ano de 1948, dois convites celebraram a maturidade de Adelaide:  além de filmar É com esse que eu vou, de José Carlos Burle, ela ganhou um contrato com a Rádio Nacional, onde ficou durante 27 anos. Seus programas mais conhecidos na Nacional foram Alma do sertão e Gente que brilha
              A TV não demorou para reconhecer os talentos de instrumentista, cantora e atriz. Adelaide trabalhou também em novelas,como Feijão Maravilha e  Deus nos Acuda, em 1992. Mesmo tendo gravado muitos discos e de ter feito shows em todo o país, Adelaide denunciou em 2009, no Senado Federal, ao lado de outros artistas, a situação precária em que vivem os antigos talentos do rádio. Na época, aos 78 anos, disse que ainda precisava trabalhar para viver. A aposentadoria de R$1.247 mal dava para pagar os remédios. Assim, carregando ainda o acordeão que pesa mais de 14 quilos, a cantora seguia se apresentando ao lado do marido e dos netos. Para a Comissão de Educação, Cultura e Esporte, a cantora pedia mais respeito aos direitos autorais, queria regulamentação da profissão e seguro desemprego para a categoria. Quem quiser saber mais histórias de Adelaide deve ir ao blog do médico Iderval Reginaldo Tenório, que faz espontaneamente uma homenagem aos músicos brasileiros.

                            

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