segunda-feira, 18 de dezembro de 2017

Jackson do Pandeiro, O Rei do Ritmo

Rose Esquenazi



          Hoje vamos falar sobre José Gomes Filho, que todo o mundo conhece por Jackson do Pandeiro.  José Gomes era filho de um oleiro – aquele que fabrica cerâmica de barro ou argila - e da coqueira Flora Mourão – a que canta cocos, gênero musical nordestino. O músico nasceu em Alagoa Grande, em uma casinha muito pobre, na Paraíba, no dia 31 de agosto de 1919. Teve uma carreira importante dos anos 40 a 60 e ainda hoje é reverenciado, tendo a sua obra resgatada.  Ele continua presente no Nordeste o ano todo e nas festas juninas em todo o país. Foi chamado de Rei do Ritmo.
        E como tudo começou? A mãe Flora tinha um grupo musical sendo que o zabumbeiro João Feitoza costumava desaparecer. Desde os 7 anos, Jackson ficava no lugar dele e passou a tocar zabumba muito bem. Foi trabalhar em uma padaria e gostava de assistir a filmes mudos. Olhando os nomes dos personagens masculinos do faroeste, Jack e Jackson, escolheu um pseudônimo para ele: Zé Jack. Mais tarde, frequentador de cabarés, aprendeu a improvisar e ganhar cada vez mais intimidade com o pandeiro que ganhou da mãe. Jovenzinho, estreou no Cassino Eldorado e, em 1945, entrou para a Rádio Tabajara, de João Pessoa. Para quem quiser saber muito mais, leia a biografia sobre Jackson do Pandeiro, assinada por Fernando Moura e Antonio Vicente. Essas informações que acabei de dar são desse livro.
         Anos mais tarde, um radialista lhe disse que era difícil apresentar esse nome Zé Jack ao microfone, então o músico mudou para Jackson.  Como o pandeiro era o instrumento preferido, virou Jackson do Pandeiro. Nas rodas musicais de Pernambuco, o músico aprendeu outros instrumentos e participou de muitos grupos e orquestras em Campina Grande, João Pessoa até chegar ao Recife. Em 1948, estava sendo fundada a Rádio Jornal do Comércio, uma potente emissora do poderoso grupo do Jornal do Commercio, de Assis Chateaubriand. Logo ocorreu a expansão radiofônica em todo o estado de Pernambuco. O slogan da Rádio Jornal do Comércio era um tanto pretensioso: “Pernambuco Falando para o Mundo”. Na época, de fato, os transmissores de ondas curtas e médias eram os mais modernos do país e atingiam em cheio o Nordeste, além de outros estados brasileiros e também parte do mundo!
          Aos 18 anos, Jackson fazia parte do elenco que inaugurou a Rádio Jornal do Comércio. Com uma “voz rústica e as piruetas rítmicas que executava nos instrumentos musicais”, segundo nos ensina o pesquisador Jairo Severiano, Jackson estava maduro para gravar seu primeiro disco.
         A gravadora Copacabana percebendo o talento do músico, pediu que seu representante no Nordeste, Genival Macedo, o contratasse para gravar um disco. Mas Jackson tinha medo de avião e não se arriscou a vir para o Sul. Acabou gravando nos estúdios de Rádio Jornal do Comércio, em 1953. No repertório, havia uma variedade de gêneros que causaram impacto nos grandes centros do Sul. Três cocos, três rojões, um baião, um frevo, um batuque e um samba. Multitalentoso, como se vê.  Nascia um grande sucesso, Sebastiana, de Rosil Cavalcanti.  
         Jackson do Pandeiro emplacou outro grande hit: Forró em Limoeiro, rojão composto por Edgar Ferreira, que ouvimos no início do quadro. No rojão, o músico conta uma história, aventuras e façanhas. Diz o pesquisador Severiano, que difere do baião porque “tem ritmo mais vivo, de forte marcação”.
         Jackson do Pandeiro conheceu a primeira mulher, Almira Castilho de Albuquerque, no estúdio de rádio. Os dois se casaram em 1956, e só se separaram em 1967. Almira Castilho era professora e começou a trabalhar no rádio em 1954, como corista. Participava do coro na apresentação de Sebastiana por Jackson do Pandeiro. Era rumbeira e radioatriz da Rádio Jornal do Comércio e parceira do marido. Juntos eles interpretavam um grande sucesso O canto da ema. 
         Depois da separação, Jackson do Pandeiro se casou com a baiana Neuza Flores dos Anjos. Segundo Jairo Severiano, o jeito de Jackson do Pandeiro era diferente de Luiz Gonzaga, que já fazia sucesso na época. Enquanto Gonzagão era romântico e “sóbrio”, Jackson, mostrava-se mais “alegre, buliçoso, sacudido”, tornando-se “um dos maiores artistas nordestinos. Nesse tempo, Jackson estava no Rio de Janeiro e ganhou um contrato na Rádio Nacional.
         A Rádio Nacional fez explodir o talento do nordestino, que emplacou também outros sucessos como Chiclete com Banana  e Um a Um.  Durante nove anos, de 1953 a 1960, Jackson viu a sua consagração. Não era à toa que os críticos e o público elogiavam tanto o talento. Afinal, ele cantava com maestria o baiãococosamba-coco, rojão mas também marchinhas de carnaval. Sabia improvisar e diziam os fãs, era um tanto “jazzístico”.
         O canto da ema podia ser agourento, mas o do Jackson dava sorte a inúmeros compositores que ele ajudou a divulgar. Os já citados Rosil  Cavalcanti, João do Vale que, anos mais tarde, ficou conhecido pela canção Carcará, interpretada por Maria Bethânia. E também Gordurinha, Edgar Ferreira, Genival Macedo.
         Outra grande marca de Jackson do Pandeiro era a maneira diferente de dividir as palavras na música. Por essa razão, influenciou grandes músicos que vieram nos anos 60. Segundo os biógrafos Fernando Moura e Antônio Vicente, ninguém “dividia” como Jackson do Pandeiro. Para os autores, “dividir” é “balançar, suingar, quebrar para fazer requebrar, inverter tempos, criar síncopes, mexer com na estrutura da frase musical para fazer com que o ouvinte se mexa”. Interessante, não é? Vamos ouvir Chiclete com banana e a explicação de como Jackson inventou um nome diferente para ele. Atenção para o batuque do pandeiro e para a incrível frase: “quero ver o tio Sam de frigideira, numa batucada brasileira”.
          Como todos os músicos do rádio, Jackson do Pandeiro teve uma fase decadente. Foi difícil competir com a Bossa Nova e com a Jovem Guarda. Mas, no fim dos anos 60, sempre que podia Gilberto Gil se referia a ele, e usou a divisão musical criada por Jackson no Tropicalismo. Zé Ramalho, Alceu Valença, João Bosco beberam nas mesmas águas do paraibano.  João Gilberto, que era baiano, afirmou que Jackson foi seu grande inspirador. Ou seja, mesmo afastado por algum tempo, teve participação na gênese desses novos movimentos.
         O último álbum de Jackson do Pandeiro, chamado Isso é que é Forró!, foi gravado em 1981. Ao todo, foram 29 anos de carreira artística, muitas gravadoras e excursões. Como ficou diabético desde os anos 60, morreu aos 62 anos, em 10 de julho de 1982, em  Brasília. O escritor Rodrigo Faour vasculhou o país para lançar, em 2001, uma caixa com 9 CDs dos anos 60 e 70 com, nada menos, do que 235 músicas. O Rei do Ritmo entrou para sempre na galeria dos grandes músicos nordestinos, onde estão também Luiz Gonzaga, Hermeto Pascoal, Sivuca e, mais recentemente Chico Science. Para encerrar, escute mais um sucesso do Jackson do Pandeiro: Capoeira mata um.

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