domingo, 24 de dezembro de 2017

Alberto Ribeiro, um compositor genial


Rose Esquenazi





         Alberto Ribeiro, compositor de mão de cheia, foi fiel parceiro de João de Barro, o Braguinha, que todo mundo sabe quem é. Alberto conheceu João de Barro em 1935, através do editor Mangione e juntos criaram uma grande amizade e sintonia musical.  A música Yes, nós temos banana, que acabamos de ouvir é dessa dupla criativa e afinada que compôs grandes sucessos na MPB. Ao morrer em 10 de novembro de 1971, aos 69 anos, Alberto deixou para nós nada menos do que 400 composições.

          Vou começar contando como nasceu a marchinha de carnaval Yes, nós temos banana. Em 1923, nos Estados Unidos, os compositores Frank Silver e Irving Cohn morreram de rir ao ouvir um grego, dono de uma quitanda, dizer para um freguês:  “Yes, we have no bananas”. Ou seja, “Sim, não temos bananas”. Criaram a musica Yes, we have no bananas que estourou por lá. Segundo o pesquisador Jairo Severiano, que contou essa história no livro A canção no tempo, volume 1, 15 anos depois, Braguinha e Alberto Ribeiro lançaram a versão nacional da música, um pouco para criticar a postura dos americanos que costumavam chamar o Brasil de República das Bananas. A voz que interpreta esse grande sucesso já foi de Almirante e tantos outros cantores, mas ouvimos aqui a versão de Ney Matogrosso. Aliás, temos que tirar o chapéu para Ney que comemora 40 anos de carreira artística.

           Vamos começar pelo início. Alberto Ribeiro da Vinha nasceu no bairro da Cidade Nova, no Rio de Janeiro, em 27 de agosto de 1902. O carioca começou a compor músicas para o bloco carnavalesco Só de Tanga. A primeira criação de que se tem notícias é Água de coco, com Antônio Vertulo, em 1923. Ou seja, tinha apenas 21 anos. Depois, foi morar no bairro do Estácio e lá conheceu um grande compositor, o Bide, Alcebíades Barcelos, e passou a compor com ele. Chegou a gravar dois discos em 1930 com o Grupo dos Enfezados, do qual fez parte.

         Como muitos jovens ainda hoje, Alberto ficou na dúvida que carreira seguir. Tentou engenharia, passou para a medicina, formando-se em 1931. Escolheu a homeopatia como especialização. O consultório ficava na Rua Senador Dantas, 20, e ele não costumava cobrar muito alto. Sabia que nem sempre o povo podia pagar.

          Apesar de seguir a carreira médica e, muitas vezes, tratar das pessoas gratuitamente, era na música que ele dedicava a sua criatividade.  Vamos ouvir alguns sucessos que ele criou sozinho, como Casar não é comigo, com a cantora Zezé Fonseca, gravada em 1933. Prestem atenção na letra que diz “casar não é pra mim”, apesar de o compositor ter se casado em 1926. Ouça a marcha no Youtube.

         O encontro com João de Barros foi decisivo. Os anos 30, considerados a Época de Ouro da Música Popular Brasileira, foi também o tempo de crescimento das emissoras de rádio, principalmente no Rio de Janeiro. Estavam em pleno vapor a Rádio Philips, a Mayrink Veiga, a Rádio Clube do Brasil, a Rádio Educadora, só para citar as principais. A Nacional só iria se tornar verdadeiramente popular a partir de 1940. O rádio atraía todas as atenções e, pensando nisso, o americano Wallace Downey chegou ao Brasil querendo investir em filmes musicais. Já que não havia televisão ainda, o cinema seria a maneira de ver os ídolos dos rádios na tela grande.

          Perspicaz, Wallace convidou dois grandes compositores, João de Barro e Alberto Ribeiro para argumentistas e também responsáveis pela trilha sonora, dos filmes Alô, alô, Brasil!, Estudantes, os dois de 1935, e Alô, alô carnaval!, de 1936. Foram grandes sucessos, mas, infelizmente, sobrou pouco dessas três produções geradas na Cinédia de Ademar Gonzaga que tentava industrializar o nosso cinema. É possível assistir a alguns trechos no YouTube.
Divertido e crítico, o médico Alberto Ribeiro, sozinho, decidiu puxar a orelha dos poetas e compositores que viviam falando da lua no momento em que escreviam versos apaixonados. Assim, criou Deixa a lua sossegada, que vamos ouvir na voz de Almirante. Na letra, ele diz:
 “Se não houvesse lua eu asseguro// O mundo no escuro// Seria muito bom// Um beijo começava em Realengo// Esquentava no Flamengo// E acabava no Leblon//,

          Alberto Ribeiro se referia ao namoro recatado que começava no subúrbio, em Realengo, passava para o Flamengo, na Zona Sul, e, já mais quente, acabava no Leblon, onde existia o único motel da cidade. Interessante, não é? Como já disse, João de Barro e Alberto Ribeiro combinavam muito bem no momento de compor. Em 1936, para mostrar a presença marcante do rádio em todas as casas, os dois compositores e mais Lamartine Babo lançaram Os cantores do rádio, interpretada  pelas irmãs Aurora e Carmem Miranda no filme Alô, alô, Carnaval.

          Em 1938, eles se inscreveram em um concurso da Prefeitura com a música Touradas em Madri. A marcha ganhou em primeiro lugar, na frente de Pastorinhas, Sereia e Camisa Listrada. Só que os organizadores do concurso implicaram com Touradas em Madri, alegando que era em ritmo estrangeiro chamado paso doble, e desclassificaram a música. Venceu, então, o segundo lugar Pastorinhas, que também era de Braguinha e de Noel Rosa, que já havia morrido. A história dessa música também é curiosa. Escrita em meia hora, em um bar da cidade, chamava-se Linda morena, que não fez sucesso. Braguinha trocou a palavra moreninhas por pastorinhas e inscreveu também no concurso. Até hoje as duas músicas fazem grande sucesso no Carnaval. Ouça Touradas em Madri, com Almirante, gravada em 1938.

          Gosto muito da marcha As brabuletas, interpretada pelo próprio Alberto Ribeiro e gravada em 1933. Mas existem pequenas obras-primas do compositor como a clássica das festas juninas, Noites de Junho. Tem uma linda interpretação de Emilinha Borba, de 1958. A música Sonho de papel, também com João de Barro, fazia parte dessa lista de canções do meio do ano. Podemos citar muitos outros sucessos, como Pirulito, Onde o céu é mais azul, considerada samba de exaltação, de um tempo em que os compositores decidiram puxar a sardinha para o governo brasileiro. 

          Alberto Ribeiro e Braguinha lançaram em 1946, Copacabana, interpretada com brilhantismo pelo cantor Dick Farney. A música estourou no mundo todo e foi considerada a precursora da Bossa Nova. O trabalho talentoso e tão brasileiro de Alberto Ribeiro, sozinho ou ao lado de Braguinha, faz muita falta no cenário brasileiro. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário