domingo, 24 de dezembro de 2017

Ema e Walter D’Avila: os irmãos do riso


Rose Esquenazi




         Os irmãos Ema e Walter D’Avila foram dois comediantes geniais do rádio brasileiro. Nascidos em Porto Alegre, Ema, no começo da carreira, queria ser atriz. Chegou ao Rio de Janeiro, a convite do diretor de teatro Jardel Jercolis,  nos anos 30. Ela trabalhou nas companhias de teatro de revista e chegou a contracenar com atores importantes, como Alda Garrido. Depois, passou a frequentar o rádio onde a sua veia cômica apareceu fortemente.

        Nascida em 10 de abril de 1916, Ema era cinco anos mais nova do que o irmão Walter D’Avila, que nasceu em 19 de abril de 1911. Infelizmente, o acervo sonoro dos atores se perdeu, mas, para quem tem mais de 60 anos, é impossível esquecer as expressões de Ema e de Walter. Ele interpretava o personagem Baltazar da Rocha, na Escolinha do Professor Raimundo. Ema fez vários papéis nos humorísticos.
           Walter estreou na Rádio Sociedade Gaúcha, em 1952. Mas logo estava no Rio de Janeiro onde surgiam as melhores ofertas profissionais. Depois de passar pela Rádio Mayrink Veiga, Walter estreou na TV Rio, em 1956, no programa Praça da Alegria. Ele fazia o papel de O Sabichão, um ignorante total que lia os livros dando uma entonação totalmente diferente e, dessa maneira, deturpava o conteúdo. Ele contracenava com Manuel da Nóbrega, que fazia um senhor idoso e barrigudinho, que era o conversador na praça. Muitas vezes, Walter dizia que estava adorando o livro. Na TV,  o público via que o volume estava de cabeça para baixo. E quando Manuel perguntava como era o livro, o Sabichão, com cara de inteligente, dizia: “É de papel mesmo”. Ficaram na lembrança também o personagem Seu Obturado, um sujeito que só entendia a piada muito tempo depois de ser contada. Do nada, começava a rir sem parar. Era interessante e divertido.
           As expressões faciais de Walter D’Avila eram muito curiosas porque ele parecia seríssimo. Ao mesmo tempo, era do tipo bonachão com voz forte. Podia ser confundido com algum parente da gente que ficou perdido no interior. De repente, essa pessoa aparece na cidade grande só pra gente passar vergonha. Vamos ouvir Walter contracenando com Chico Anysio, o professor Raimundo. Chico Anysio começou a trabalhar em 1947, na Rádio Guanabara. Bem que ele merece um quadro no Rádio faz história só para ele.  Chico e os irmãos D’Avila se encontraram nessa mesma estação. Nos programas de auditório, o público morria de rir. Em casa, também a família gargalhava em torno do único rádio, que ficava na sala.

         Para ilustrar, vamos apelar para o som da TV. Walter contracenava com Chico Anysio que, na TV Globo, salvou a vida de muitos humoristas antigos. Ele contratava todo o mundo para a Escolinha para que eles pudessem, ao menos, ter um plano de saúde. Era tão explícita essa admiração aos irmãos D’Avila que Chico chegou a montar um programa da concorrente, A Praça da Alegria, para receber os talentos do rádio.  Seu Baltazar confunde tudo, troca tudo, é um sem noção total. Ingênuo, mas divertido. No quadro, o avô é interpretado por Renato Aragão. O programa especial foi ao ar em 1990.
         Ema D’Avila era magrinha e tinha uma cara ótima, engraçada. Apesar de não ser uma mulher bonita, tinha seu charme. O rádio também prometia, assim, ela foi deixando o teatro passando a se dedicar à Rádio Mayrink Veiga e depois à  Nacional. Identificada com timing de humor, Ema participou de alguns filmes, como o Meia canha, de 1960, realizado pela Atlântida, que ouvimos no começo do quadro. Na boate com a filha, ela é convidada para dançar com um sujeito esquisito, e, de repente, começa a cantar com uma voz muito estranha.
        No site Memória Globo, sabemos que o programa Professor Raimundo, na Mayrink começou em 1952. Ema estava lá, mas logo aceitou o convite da TV Rio. Chico Anysio fazia a escada para comediante no programa Aí vem dona Isaura, em 1957. Mais tarde, na TV Globo, convidou Ema para a atração Estados Anysios de Chico City, de 1991. Além disso, ela participou também de do humorístico Humor Livre e de algumas novelas, como Marron Glacé, os Garçons, como Dona Bea,  em 1979. Antes de estrear como Dona Biloca, em A Gata Comeu, a atriz sofreu um derrame cerebral e, no dia 16 de março de 1985, morreu, deixando dois filhos. Dona Biloca acabou sendo interpretada pela atriz Norma Geraldy. Vamos ouvir a música Transviados, de João Roberto Kelly, com Ema D’Ávila e Waldir Maia. O programa se chamava Times Square, da TV Excelsior, que foi ao ar em 1960.

         O humor da TV nasceu no rádio, principalmente na Mayrink Veiga, Tupi e Nacional. Os candidatos que queriam entrar para o mundo radiofônico e ganhar um dinheirinho passavam, primeiramente, pelos programas de calouros. Podiam tentar uma vaga de imitadores, contadores de piadas, atores ou autores histriônicos. Era o começo de uma vida profissional que podia ou não dar certo. Às vezes, um amigo ou conhecido da família indicava um jovem talento. Para evitar canastrões, tão comuns no início do rádio no Brasil, nos anos 20, era necessário fazer testes ao vivo. Os diretores queriam sentir como a voz soava nas ondas misteriosas do rádio. Outro fenômeno acontecia no rádio e depois na TV da época. Oferecia-se uma maior cachê ao artista que estava agradando mais o público. 

         Na Rádio Nacional, fizeram sucesso os programas Piadas do Manduca, Tancredo e Trancado, Hotel do Pimpinela e, o maior de todos, PRK-20 que depois se tornou PRK-30, emissora clandestina que, supostamente, interrompia as transmissões da Nacional. Havia também o Levertimento, a Turma da Maré Manda e A Cidade se Diverte.

          Segundo a autora Miriam Goldfeder, no livro Por trás das ondas da Rádio Nacional, o humor nos anos 50 era diferente no Rio e em São Paulo. No Rio, segundo Miriam, havia as “chamadas fórmulas cômicas, isto é, modelos de incitação ao riso baseados em macetes conhecidos pelos autores que deles se utilizavam para obter os efeitos pretendidos”. Havia a repetição dos bordões que grudavam no ouvido do público.

        Já em São Paulo, em programas como Marmelândia, de Max Nunes e Haroldo Barbosa, que também escreviam o Balança mas não cai carioca, e no programa História das Malocas e A Rua do Sossego, havia mais sátira política. Talvez pela distância da Capital Federal e da censura mais efetiva.
        O humor dos irmãos D’Avila não era politizado ou satírico. Tal como a irmã, Walter trabalhou no cinema, nos filmes Família Lero-lero, de 1953, onde fez o papel de Aquiles Taveira. Esteve no elenco de Na corda bamba, Os dois ladrões e Pintando o sete, nos anos 60. Foram muitos os programas de rádio e de TV, mas Walter só trabalhou em uma novela, o  Feijão maravilha, no papel do Scarface.
      Vamos nos lembrar de Walter D’Avila, no papel de Arnaldo, que contracenava com Jô Soares, um médico sem noção. Arnaldo estava nervoso porque ia se operar mas, antes disso, decidiu conversar com o amigo. Quando dizia o nome do médico, do hospital e do anestesista, o amigo se traía e mostrava que eles não eram nada confiáveis. Coitado do Arnaldo! Walter morreu no dia 19 de abril de 1996, de insuficiência cardíaca, mas não foi por culpa dos médicos.. Vamos ouvir o diálogo no YouTube?


Um comentário:

  1. Li em outra biografia que Walter nasceu em 29.11.11, seu falecimento ocorreu em 19.04.96, qual data é a correta?

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